sexta-feira, 23 de julho de 2010

ANÁLISE DO LIVRO DIDÁTICO

UNIVERISIDADE DO ESTADO DA BAHIA
CAMPUS X - TEIXEIRA DE FREITAS
DISCIPLINA: Laboratório do Ensino de História V
DISCENTE: Selma Moreira de Queiroz


ANÁLISE DO LIVRO DIDÁTICO


Justificativa:


No intuito de conhecer melhor o que há de positivo e negativo ao se elaborar um livro didático, e no propósito de empregar os conhecimentos adquiridos na escolha dos livros, como suporte no exercício de minha profissão, é que farei a análise dessa Coleção para que ao final, possa fazer uma interpretação crítica da mesma.


Princípios Históricos

O autor faz uma observação importante em sua obra a de que os livros didáticos são obtidos através da leitura de outras obras, de outros historiadores. Isso contribui para que o professor possa informar ao aluno que nem sempre o que traz o livro é coerente com a realidade. Embora muitas vezes o professor não passa essas informações ao aluno e este passa a aceitar tudo que o livro informa como se fosse verdade absoluta.
A obra traz alguns traços da historiografia renovada, porém, repleta de imagens e conteúdos muito limitados, não abrindo espaço para que o aluno viaje um pouco mais nos conteúdos para entender melhor o contexto em que aquele assunto se insere.
No texto diz que: as reflexões sobre o texto complementar trazem perguntas que devem ser respondidas sempre de acordo com o que o autor do texto complementar escreveu. Mas também será importante relacionar essas informações com o que foi aprendido no texto principal. Com isso, quer o autor deixar de fora a participação crítica do aluno?Seria bom nesse momento que o aluno já inserisse seu senso crítico nas respostas. Entretanto as questões acerca da reflexão crítica só vão aparecer ao final do capítulo e de forma bem sucinta. Acreditamos que se houvesse mais riqueza dessas reflexões durante a exibição do conteúdo, ou seja, se essas críticas já fossem sendo feitas ao longo da explicação dos assuntos, elas fluiriam mais e exploraria a autonomia critica do aluno.
Uma vez que isso não acontece dessa forma no livro, cabe ao professor interferir constantemente durante a exposição do assunto de forma que o aluno vá construindo autonomia crítica a fim de contribuir para provocar mudanças na sociedade em que vive.
Quando o autor propõe os exercícios de revisão como guia de estudo e como forma de evitar a decoreba, não vejo necessidade de se discutir 20 questões, por exemplo, como aparecem no livro. E muitas delas, remetem à decoreba sim. Ex: Quais foram as duas revoluções que aconteceram em 1917? Qual delas derrubou o tzar Nicolau II e instaurou o Governo Provisório? Além de trazer um estilo tradicional de ser, a questão entra em contradição com a idéia do autor de não decorar data.
Embora o autor no início do livro pregue tanto a questão de interpretação, problematização, não é o que faz realmente no decorrer dos textos. Parte quase sempre
de um problema solto, ou seja, sem fazer as devidas argumentações para que os alunos pensem por conta própria. Um exemplo bem significativo é o capítulo que trata da República Velha. Observe o início: no dia 15 de novembro de 1889, o marechal Deodoro da Fonseca vestiu a farda em cima do pijama, montou em seu cavalo e atravessou a rua para proclamar a República. Tudo bem, o professor pode até saber fazer os recortes para que essa brincadeira se torne significativa ao senso crítico do aluno. Mas e se o professor não souber fazer o recorte temporal? Será que o aluno está mesmo inteirado sobre o que realmente levou o Marechal a proclamar a República?
O livro traz pequeníssimas sínteses sobre o que os alunos estudaram anteriormente, porém, não acredito que o professor tenha interesse de revisar tudo que foi ensinado. Se é que foi, por que as escolas públicas quase sempre encerram o ano coma a metade dos conteúdos trabalhados porque nunca dá tempo.
Quanto aos conhecimentos históricos o livro deixa muito a desejar, tanto nas transformações sócio-culturais e de vivências sociais, como nas percepções de permanências, conforme já mencionei um pouco no início desse texto.
As reflexões críticas que, como já dissemos, aparecem no final do capítulo, são talvez, as únicas alternativas para que o professor trabalhe as abordagens de transformações e permanências, já que os textos complementares são quase que insuficientes.
O autor relata que o livro foi escrito tomando como base os Parâmetros Curriculares Nacionais PCNs e que muitas das propostas do PCN já eram posições ratificadas por ele, para o estudo da História, principalmente nas abordagens teóricas que problematizam a realidade social e identificam a participação ativa de pessoas comuns na construção da História. Porém o tempo, e o espaço são pouco trabalhados no livro e se o professor não utilizar outros artifícios, fica difícil articular isso.
Importante se pensar na sigla PCN Parâmetros Curriculares Nacionais lembrando que se é nacional, implica em que traz uma forma de ensino para todos e que, portanto, deve ser visto com cautela, nas suas entrelinhas antes de fazer inferência a esta ou aquela cultura.
Outro aspecto muito interessante é quando ele diz que, para o aluno se interessar por História é preciso seduzi-lo e os recursos são a inteligência, a beleza e a amizade. Para tratar do termo beleza aparecem as imagens que são em número bem elevado. O perigo está exatamente em o aluno ao se seduzir pela beleza da imagem e não souber explorá-la, em nada contribuir para o aprendizado, restando apenas à imagem o papel de embelezar o livro.
Num dos capítulos deste volume, o capítulo 12, aborda sobre a descolonização da África, porém, nem chega a tratar no capítulo todo. Apenas em um terço do capítulo, porque o restante fala sobre a Ásia. Veja que falamos descolonização. O aluno sequer compreende o processo de colonização e se teve alguma noção nas séries anteriores foi buscado pelo professor em outras fontes, porque a coleção não fornece esse conteúdo.
Alguns conceitos e noções são dados nos textos complementares e nas reflexões críticas, apenas algumas colocações, que pouco ou nada contribuirão para enriquecer o desenvolvimento do vocabulário. Os fatos históricos apresentam-se no índice de forma bem linear e corresponde aos textos apresentados no livro.
Ao final do manual do professor estão as bibliografias comentadas, fazendo o uso de abreviaturas e outras convenções. Nas obras Gerais de História estão inseridas as fontes incluindo uma diversidade de autores como KOWARICK, Lúcio, CASTRO, Hebe M. Mattos, CARDOSO, Ciro Flamarion, CHALHOUB, Sidney, FAUSTO, Boris etc.
Encontramos também no manual – Os créditos onde constam abreviações para identificar as imagens. As imagens fogem um pouco àquele esquema tradicional de um herói e uma legenda embaixo com o nome dele. Elas chamam mais atenção para detalhes, inclusive para assuntos do cotidiano. Aparecem também charges, mapas, legendas,o que possibilita ao professor trabalhar a interdisciplinaridade, inclusive em matemática.

Princípios pedagógicos
(Livro do aluno e manual do Professor)

Os objetivos e propostas do autor deste livro estão bem coerentes em relação ao que se espera do ensino nos dias atuais. Porém, as metodologias e estratégias utilizadas não conferem tão bem com o que foi proposto na coleção como um todo. A visão crítica dos conteúdos e a inserção das pessoas como consciência de transformações sociais, estão aquém do que se espera da obra. Os textos são muito curtos, não contêm recortes e só ao final do capítulo é que se vai refletir num pouco sobre o que foi estudado.
O livro propõe a ruptura com a “decoreba”. Pensamos que as atividades de revisão não satisfazem à proposta. São perguntas longas, de difícil compreensão do aluno e as que são curtas exigem pouco raciocínio crítico e não possibilita liberdade para que ele possa estender suas idéias à realidade social.
Os textos complementares aparecem um em cada capítulo, o que acreditamos ser muito pouco. Deveria haver menos imagem para dar lugar a um maior número de textos complementares.
As atividades e exercícios deveriam ser mais diversificados, consta apenas de exercícios de revisão e reflexão crítica. Não observamos nenhuma sugestão de filmes, nem passeios, palestras, entrevistas, dentre outras atividades que poderiam auxiliar o professor. Uns fatos que nos chamaram bastante atenção foi o livro (manual do professor) não traz nem objetivos gerais e específicos claros e nem proposta de avaliação. O que significa dizer que o professor terá que criar seus próprios meios de avaliar sem contar com o auxílio do livro.

Princípios para a construção da cidadania
Embora o livro apresente um número considerável de imagens relativas às classes operárias, sociedade menos favorecida, e até mesmo algumas reflexões críticas acerca das imagens, o que é um grande avanço, nota-se uma deficiência em relação aos textos. Pouco se fala nos negros, nos índios, da vida cotidiana das classes populares, bem como das revoltas populares.
A exemplo disso temos as revoltas ocorridas por ocasião do período Republicano. O livro traz: “Situação difícil, revolta do povo”. A revolta do povo, nesse período, está expressa em apenas nove linhas. Ao lado, há uma fotografia de criança operária, mas nada fala dela. Deveria discutir um pouco sobre a exploração do menor no trabalho. Quando trata da Região Amazônica, no apogeu da borracha, deveria ser bastante explorado, porém, pouco é comentado. As revoltas de Canudos, Contestado, da Chibata trazem pouquíssimo assunto que aborda o tema. Isso significa que a falta ou escassez desses elementos, deixa brecha sim, para a indução a preconceitos.
As imagens e textos da coleção, embora o autor tenha tentado inovar, ainda abordam com mais evidência os fatos e imagens com tendências européias.
É a linguagem desse livro, algo que talvez tenha sido uma das características mais importantes em termos de inovação. O autor dialoga como o aluno. Em contextos quase sempre fora de sua realidade, como aparecem no livro, é importante passar a mensagem de forma clara. Foi o que fez o autor. Isso certamente irá facilitar a interpretação dos textos por parte dos alunos.Daí, a participação da cidadania, tão mencionada nas propostas do autor, deixa uma lacuna muito grande no aprendizado do aluno, até mesmo porque o livro traz essa abordagem basicamente nas reflexões críticas e não no decorrer dos textos.
Sobre a mulher, algumas imagens aparecem nas reflexões críticas, apenas a imagem, porque, algo que informe sobre as lutas e participação da mulher, não é algo contemplado neste livro. Até mesmo na era do rádio nos anos 40 e 50, em que a participação da mulher foi significativa para “debutar” este grande veículo de comunicação da época, a exemplo de Emilinha Borba e Marlene, a mulher foi quase esquecida. Não fosse um pequeno texto que apenas informa o que foi e quem participou da era do rádio, a mulher nem apareceria. Mas nada traz nesse texto a respeito do preconceito sofrido por elas na luta para encontrar um espaço no cenário da música.

Projeto Gráfico

Quanto à editoração, podemos garantir que esta coleção é, talvez, uma das mais bem elaboradas que conhecemos em matéria da hierarquização da estrutura. Os títulos e subtítulos são bem demarcados com legibilidade, correspondendo também à clareza dos textos. As imagens, embora em número elevado, como já dissemos antes, apresenta-se com bastante nitidez e não impede que o verso da folha seja legível.
O sumário deveria ser mais especificado para o aluno poder se orientar melhor. Carece de um pouco mais de especificidade nas páginas onde seriam indicados os subtítulos a fim de que ao retornar para o estudo do capítulo, o aluno saiba qual a página do subtítulo onde ele deve continuar.


No Conjunto da Coleção

Em se tratando das referências bibliográficas vimos que estas aparecem constando do autor, título, editora, data, porém essas referências só aparecem no manual do professor. No livro do aluno aparecem os créditos. Outro detalhe que não aparece no livro do aluno são os textos comentados. Pensamos que seria importante que os alunos também tivessem acesso a estes textos, de maneira que pudessem entender de forma simplificada o que às vezes no texto original não fica tão claro.

Conjunto Visual

Quanto ao conjunto visual há uma forma de organização muito confusa aos olhos dos alunos. Embora as imagens sejam de boa qualidade elas se misturam muito aos textos. Pensamos que ao ler, o aluno poderá desviar um pouco a atenção do texto para ver as imagens. Os textos informativos complementam o recheio das páginas, causando uma tremenda poluição visual. Mas disso já temos conhecimento em outras leituras que o autor nem sempre participa da finalização da obra. As editoras se encarregam, junto com os técnicos em iconografias, pelo trabalho de edição final do livro. Ficando autor e professor a mercê desse caráter mercadológico do livro didático.


Cabe ao professor ao adotar o livro didático, atentar para esses aspectos que foram abordados ao longo do texto, como: legibilidade, qualidade das imagens, organização sumária, aspectos sociais abordados, dentre outros, para que possa comparar com outras coleções, visando a realidade do seu aluno, pretendendo assim adaptar seu livro ao que estiver proposto e de fato for possível de ser trabalhado.
Deve, ao utilizar o LD, procurar fazer recortes nos conteúdos, fazer bastante leitura para se inteirar dos assuntos de forma contundente a fim de poder orientar melhor sua clientela. Também deverá empregar diferentes artifícios em suas aulas como DVD, filmes, revistas, etc., além, disso, trabalhar as imagens antes mesmo de apresentar os conteúdos.


Parecer

Embora a coleção não seja, ou melhor, não traga todas as características ideais para uma educação inovadora, acreditamos que o autor tenha, em alguns aspectos, sido feliz na escolha e dessa forma, o livro será um material auxiliar para o professor, mesmo sendo ineficaz. O professor é quem fará a diferença. Pode o livro ser perfeito, se o professor não o souber utilizar, não servirá como veículo de transformação.
REFERÊNCIA: SCHMIDIT, Mário Furley.Nova História Crítica,5/8 séries do Ensino Fundamental.Ed.Nova Geração,2001.









segunda-feira, 12 de julho de 2010

AS CRUZADAS


Dentre as mudanças ocorridas na Ordem Feudal, mais especificamente na Alta Idade Média, estão as Cruzadas, que abriram caminho para que o feudalismo mergulhasse num irreversível e lento declínio causando a desagregação do Regime Feudal.
A cidade é Clermont, na França, o ano é 1095, quando o Papa Urbano II reúne uma multidão de nobres, religiosos, fanáticos e gente de toda natureza, em meio a choro e argumentos diversos, ele exorta os cristãos a organizarem uma expedição rumo a Jerusalém com o objetivo de resgatá-la dos árabes que desde a Alta Idade Média já tinham a sua posse.
Em seu apelo à primeira cruzada o papa Urbano II conclama: “A todos aqueles que partirem para as Cruzadas e perecerem no caminho, seja por terra, seja por mar, ou que perderem a vida combatendo os pagãos, será concedida a remissão de seus pecados.” (História Viva, Janeiro de 2005).
Após terem transitado por Constantinopla e partirem para a conquista da Palestina, os cruzados sabiam muito pouco sobre o mundo que iriam penetrar. Ignorantes que eram da história das nações Islâmicas, de acordo com Jaime Pinsk, era muito complicada essa convocação, pois a maioria das pessoas nem sabiam onde ficava Jerusalém e nem sabiam se deviam ou não considerar os argumentos do Papa.Apenas os mais esclarecidos sabiam vagamente que Jerusalém e boa parte do Oriente já era conquista dos árabes desde o século VIII.
Em meio a quatro séculos a partir da convocação do Papa, havia um convívio mais ou menos amistoso entre os dois lados. Os árabes sempre foram de acordo com as caravanas que atravessavam a Europa para chegarem a Jerusalém.Pinsk questiona: Se o clima não era tão tenso, por que então o Papa em prantos, ressaltaria a moral e a fé das pessoas que escutavam no Concílio de Clermont no século XI?
Daí percebermos as suas reais intenções quando fala sobre o surgimento de uma raça oriunda do Reino dos Persas, uma raça maldita, alheia a Deus, que invade as terras dos cristãos.Invadiram com violência, mataram cativos, levaram outros, destruíram igrejas.O Papa conclama as pessoas a acabarem com o ódio, desavenças e que entrem na Terra do Santo Sepulcro e arranquem daquela gente malvada a terra que segundo o que diz as escrituras, “escorre leite e mel”.Segundo seu discurso, Jerusalém era o centro do mundo, e suas terras eram mais férteis do que todas as outras.
Com isso percebe-se nas suas intenções o interesse por conquistar terras produtivas, utilizando da boa fé das pessoas em nome de Deus. Isso fica claro quando diz: “Quando o ataque for lançado sobre o inimigo, que um grito seja dado pelos soldados de Deus: Deus o quer! Deus o quer! Insistia ainda em dizer que Jerusalém e os Lugares Santos eram espezinhados.
Desse modo entende-se que a motivação religiosa inicialmente foi canalizada para a retomada de Jerusalém. As pessoas ricas, pobres, citadinas, camponesas, crianças, mulheres, monges, demonstraram uma grande vontade de irem à Jerusalém ou ajudarem a quem fossem. Foram também soldados, Ladrões, Piratas, que surgiram tocados pelo Espírito de Deus, confessando seus crimes, arrependendo-se deles, partiram para asa Cruzadas a fim de satisfazerem a Deus por causa dos seus pecados.
Os invasores permitiam a ida de peregrinos apenas eventualmente, mas achavam muito pouco dadas à sede que tinham em conquistar terras. Em outras palavras, a Igreja não poderia permitir que Jerusalém ficasse nas mãos de infiéis. A bandeira e o objetivo inicial das Cruzadas do Oriente foi a retomada da Terra Santa.
Os cristãos partiram divididos. Uns, a grande minoria, em busca da salvação praticando boas ações em nome de Deus. Outros, a grande maioria, saqueava e matava com extrema crueldade. Em dois textos de autores árabes que relatam a tomada de Jerusalém, dão testemunhos de massacres e pilhagens: BBUYA’ALÁ HAMZA (1073-1160), e SET BAL-JAWZI (1186-1256), chegam a falar em mais de cem mil mortos.
Pinsk adverte para o discurso de Clermont, em que o Papa enfatiza as atrocidades praticadas pelos muçulmanos e implicitamente ele instiga o povo a fazer o mesmo: “ arranca aquela terra da raça malvada para que fique com vosso poder”. Diversos senhores feudais em desvantagens, suscitaram a ambição em função das “terras que jorravam leite e mel”. Após a morte do senhor feudal chefe da família, as terras eram entregues aos herdeiros mais velhos. Muitos nobres recorriam à guerra para terem o seu pedaço de terra. Com isso, asa Cruzadas despertaram os nobres “sem terras”, a tentarem conquistar facilmente asa terras no Oriente, levando-os desse modo a estimularem a formação de batalhões cruzados.
O contexto era socialmente favorável à formação das Cruzadas. Em virtude das grandes mudanças que ocorreram a partir do século XI, na agricultura multiplicando a produção, na construção de pontes, utilização de ferraduras nos cavalos dentre outras alterações técnicas que desenvolveram e modernizaram a agricultura aumentando a produção, as pessoas enfrentando melhor a doenças, tudo isso gerou um aumento populacional. Contudo havia o lado negativo. Nem todos conseguiam trabalho e centenas de camponeses, sem trabalho, vagavam a ermo pelas estradas. A solução encontrada para esses desocupados foi deslocá-los para o Oriente, para onde, de acordo com a promessa do Papa Urbano II encontrariam “terras que jorravam leite e mel”.
As cruzadas tiveram como base uma população excedente, na condição de atender ao apelo do Papa que prometia além de terra fértil, o perdão dos pecados cometidos.
Os cristãos esperavam contar com a ajuda de Constantinopla, o que não aconteceu, ou melhor, a ajuda se transformou num problema devido aos vários interesses que entraram em jogo. Em meio a esses interesses, organizou-se a expedição organizada por Pedro, o Eremita, um fanático religioso e em conseqüência disso essa não foi reconhecida como a primeira cruzada.
Nem todas as cruzadas chegaram a colocar os pés no Oriente como foi o caso da “Cruzada dos Mendigos”, a qual chefiada por Pedro, o Eremita, enfrentou inúmeras privações e terminou no deserto da Ásia Menor.
A primeira cruzada a ser reconhecida oficialmente pela Igreja Católica partiu em direção a Jerusalém em busca da salvação eterna. Eram franceses, normandos, germanos, sicilianos e muita gente humilde, conseguiram em fins de 1097 parte da sua intenção, recuperando para os bizantinos parte da Ásia Menor, conquistada anteriormente pelos muçulmanos. Dois anos depois chegaram a Jerusalém.
Poetas, viajantes e trovadores, decantavam aos quatro ventos a glória dos cristãos. O que não se deve esquecer é o momento desfavorável em que os árabes foram atacados. Momento em que se ocupavam com terríveis e desgastantes lutas internas. Além disso, a violência praticada pelos cristãos no combate à Cidade Santa foi exagerada.
Durante mais de dois séculos as Cruzadas associaram gerações inteiras de cristãos e muçulmanos. Não só tiveram efeitos apenas aos massacres. A violência não impedia que ligações humanas acontecessem mesmo entre inimigos, levando à superação de barreiras do ódio e incompreensão.” Emergia desse caldo outra humanidade, a decifrar e captar, como uma linha frágil através das relações guerreiras, comerciais, diplomáticas e religiosas que as histórias árabes nos deixaram.” (Revista História Nova, Janeiro-2005).
Cada um procurava encontrar equilíbrio e argumentos capazes de garantir legitimidade relativa junto aos seus e se possível junto aos adversários também. Quando um muçulmano era reconhecido por sua grande sabedoria, servia como mediador dos conflitos entre os cristãos. Ao descobrirem que os muçulmanos não eram idólatras, foram estabelecidas entre eles relações de cordialidade. Em contato com o clima do Mediterrâneo Oriental, os conquistadores do Norte foram se tornado mais brandos e seduzidos pela magia enternecedora do Oriente, deixando-se tomar pela sensualidade fascinante das mulheres. Houve até casamentos entre cristãos e sartaceiros.
Através do comércio os cavaleiros francos estabeleceram relações com os comerciantes muçulmanos. Certo pacto, digamos assim. Não que os guerreiros inicialmente quisessem isso. Porém, necessitavam repousar e experimentar os deleites do Levante. Os comerciantes lhes ofereciam tudo que fosse necessário para seu conforto, em portos já bastante ativos. Era uma questão de honra levar até eles algo que os fizessem gastar alguns trocados. Especiarias do Oceano Indico perfumes, peles do Norte, tecidos, tapetes, vidrarias, confeitos
. O Mediterrâneo era o ponto final das Caravanas que levavam todos os produtos do mundo muçulmano e do Oceano Indico as colônias venezianas, genovesas, catalãs, que ali se tinham se instalado e estavam mais preocupadas com o movimento da chegada das especiarias do que com a libertação do Santo Sepulcro.
A porta aberta pelas Cruzadas intensificou o comércio de especiarias despertando em muitas pessoas o interesse de viajar para o Oriente. O comércio estava em primeiro lugar para os mercadores. Para eles, pouco importava os resultados das guerras.
As cruzadas asseguraram durante algumas décadas, o Reino Latino de Jerusalém para a cristandade, além do Condado de Edessa, Principado de Antioquia e o Condado de Trípoli.Depois de oito décadas foram assediados pelos árabes que e recuperavam do susto e ao mesmo tempo superavam suas divisões internas.Os reinos efetivados na primeira conquista não duraram muito em virtude da fragilidade dos nobres ante o inimigo muito melhor preparado.
A queda do Condado de Odessa deu origem à Segunda Cruzada liderada pelos reis Luis VII da França e Conrado III da Alemanha. Com a tentativa dos árabes de recuperar Jerusalém em 1187, fez-se necessário organizar a terceira Cruzada liderada por Frederico Braba- Ruiva da Alemanha, Felipe II da França e Ricardo Coração de Leão da Inglaterra. As duas não deram resultados e o então Papa Bernardo I foi à loucura.
A presença de monarcas na liderança era uma espécie de reforço da autoridade pessoal.
A quarta cruzada foi organizada pelos mercadores de Veneza, interessados em aumentar as vantagens no comércio com o Oriente. Ao chegar a Constantinopla encontraram os bizantinos enveredados numa disputa sucessória que provocou o destronamento do imperador Aleixo III. Os Cruzados aproveitaram a confusão política para saquearem a capital do Império Bizantino, destruindo 1/3 da população
Com a dificuldade de reconquistar Jerusalém despertou nos fiéis mais devotos o desejo de embarcarem para o Oriente, impulsionados pelas pregações de líderes messiânicos que diziam ser o fim da humanidade. Foi aí que se formou uma inusitada cruzada por jovens e crianças.Seus líderes diziam que Deus abriria as agias do Mediterrâneo facilitando a passagem dos guerreiros infantis.A caminho muitas pessoas, como mulheres, idosos, enfermos, juntavam-se ao grupo.Como eram despreparados , sem arma e sem nenhuma defesa a não ser os cânticos religiosos e orações, eram presa fácil dos piratas e malfeitores.
Como os infanto- juvenis foram proibidos de entrarem em várias cidades e as pessoas recusavam a dividir os alimentos com esses fanáticos. A Igreja nesse momento aproveita para forjar a venda de indulgências em troca de um lugar garantido no reino do céu. Daí, os objetivos iniciais que já não eram tão “puros”, eram extrapolados pela venda das indulgências
As últimas Cruzadas foram a ratificação das empresas anteriores, prevalecendo interesses particulares de alguns aventureiros que foram para o Oriente em busca de poder e riqueza.A sexta Cruzada,1228, foi comandada por um nobre excomungado pela própria igreja, Antes de sair com as tropas, Frederico II da Alemanha casa-se com a filha do Rei de Jerusalém, abrindo as portas do reino perdido pelos cristãos.No entanto foi um reino sem força por não ter encontrado o apoio dos cristãos.Ocorrendo o aniquilamento prematuro do seu reinado.
As Cruzadas chegam ao fim, mas enquanto cavaleiros se batiam por migalhas, os mercadores cruzavam o Mediterrâneo, sendo inclusive muito bem recebidos no Oriente. Ao regressar traziam porcelanas, seda, canela, cravo, noz-moscada, espelhos, etc. dando um ânimo nas relações comerciais.


REFERÊNCIAS:Conteúdo do Livro I, INTENSIVO 2000. Curso pré-vestibular Sartre.História-
Revista História Viva, Ed. Janeiro/2005.



segunda-feira, 5 de julho de 2010

CANGACEIROS, FANÁTICOS E O PODER DOS CORONÉIS

Selma M. de Queiroz

Resumo

O presente artigo trata de algumas formas de resistência e de reação dos camponeses em especial os cangaceiros e fanáticos, no período republicano, contra a prepotência dos grandes proprietários de terras que sustentavam a riqueza e o poder à custa da opressão, da marginalização política e da espoliação das camadas pobres da população brasileira.

Palavras chave: República, Cangaceiros, fanáticos, camponeses, latifundiários.



O período compreendido entre o final do século XIX e o início do século XX foi marcado por uma série de crises de ordem econômica, ideológica, de autoridade, que foram expressas em rebeliões espalhadas por inúmeras áreas do interior do Brasil, abrangendo principalmente os habitantes do campo.
Por volta de 1900, cerca de 60% da população ainda vivia na zona rural e eram em grande parte, camponeses, os que constituíam a parcela mais explorada e oprimida da população, aqueles que nada possuíam e tinham algo a reivindicar, ainda que não soubessem formular claramente essa reivindicação. Esses camponeses trabalhavam nas terras dos grandes proprietários fazendeiros pelo sistema de parcerias ou mediante pagamento de salários. Em algumas áreas, como as cafeeiras paulistas, a situação desses trabalhadores não era tão ruim o que não se poderia dizer o mesmo do norte do Brasil, em que os seringueiros embrenhavam-se pelas florestas enfrentando todos os perigos para recolher a matéria-prima da borracha, o látex, para atender ao mercado internacional e dessa riqueza os seringueiros nada viam, ao contrário, estavam sempre endividados com os latifundiários.
Os coronéis imperavam nas áreas rurais, principalmente no Nordeste. Especificamente na Bahia, os coronéis do cacau se transformaram em personagens políticas e da literatura nacional. No entanto, os milhares de trabalhadores só conseguiam ter uma vida melhor quando se transformavam em jagunços desses coronéis .
Portanto, a situação dos trabalhadores rurais nada mais era do que uma vida de miséria. Caso reivindicassem qualquer direito ou benefício, eram despedidos. Com um pouco de sorte, encontravam outro fazendeiro que os deixava ocupar um pequeno pedaço de terras, para serem novamente oprimidos e injustiçados.
A resposta vinha rápido através das balas dos jagunços ou das forças consideradas legais, caso esses camponeses se revoltassem contra qualquer insatisfação.
Com relação às leis da República, maiores e alfabetizados tinham direito ao voto. Como a maioria dos camponeses era analfabeta, o direito de voto não lhes era concedido, o que na verdade, pouco adiantava o direito de votar nas zonas rurais uma vez que esses, considerados votos de “cabresto” só seriam possíveis, caso os coronéis estivessem de acordo. As eleições eram por eles controladas. Como o voto era aberto, isto é, não era secreto, os coronéis podiam saber se seu “curral eleitoral” estava obedecendo, caso contrário o “traidor” iria sofrer as conseqüências que na maioria das vezes eram atos de violência.
Dessa forma, os camponeses não tinham quase nenhuma esperança de melhoria de vida. Bastava caírem as vendas externas ou advir uma seca prolongada, tudo se transformaria em fome, miséria e desespero, causando emigração em larga escala.
Contra a fome e a miséria que aumentavam com a seca, manifestam dois tipos de reação por parte do enorme número da população pobre que vivia sem nenhuma assistência do governo e à mercê dos coronéis:
a) a formação dos grupos de cangaceiros que lutam de armas nas mãos assaltando fazendas, saqueando comboios e armazéns de víveres nas próprias cidades e vilas;
b) a formação de seitas de místico-fanáticos em torno de um beato ou conselheiro, para implorar dádiva aos céus e remir os pecados, que seriam as causas de sua desgraça .
Canudos, Juazeiro, o Contestado e um sem número de episódios semelhantes mais restritos, como: Pau de colher, Caldeirão, Pedra Bonita, foram alguns dos movimentos das massas dos trabalhadores do campo que eclodiram em diferentes pontos do Brasil ao lado do cangaceirismo, que se prolongou até a década de 40.
Para nossa história, esses fenômenos têm sido vistos como extra-históricos. Os livros didáticos usados pelos professores nas escolas trazem muito pouco esses acontecimentos e quando trazem não são em sua essência, mas sim a eclosão e a motivação das lutas num falso pressuposto de que elas têm no misticismo ou messianismo sua origem e seu fim.(Grifo meu). “Banditismo’ e “fanatismo”, são expressões que os resumem, eliminando-os dos acontecimentos que fazem parte de nossa evolução nacional, de nossa integração como Nação, de nosso lento e deformado desenvolvimento econômico .
Mas seria mesmo, simples criminosos esse grande número de pobres do campo que se rebelavam nos sertões durante um tão largo período da História do Brasil? Será que poderíamos chamá-los de “retardatários” da civilização como os qualificou Euclides da Cunha? Evidente que não.(FACÓ,1965.p.16) . Penso ser muito mais fruto de uma desigualdade social. (Grifo meu).
Os surtos de cangaceirismo e fanatismo tiveram causas internas e externas, dentre outras coisas. Como já foi mencionado no início desse artigo, o monopólio da terra nos reduziu a um atraso cultural, encarcerando maciçamente as populações rurais da nossa hinterlândia, a que chamamos sertão, estagnada por quatro séculos.

CANGACEIROS E FANÁTICOS

Não podia o homem continuar passivo diante de tanta adversidade. Cruzar os braços diante de uma série de coisas que se deslanchavam sobre eles. Seria desumano demais. Euclides da Cunha já compreendera que:





O homem do sertão [...] está em função direta da terra. Se a terra é para ele inacessível quando possui uma nesga de chão vê-se atenazado pelo domínio do latifúndio oceânico, devorador de todas as suas energias, monopolizador de todos os privilégios, ditador das piores torpezas, que fazer senão revoltar-se? Pega em armas sem objetivos claros, sem rumos certos, apenas para sobreviver no meio que é seu .


Os homens da classe dominante sentem-se assustados sem saber explicar porque ele se revoltou. Humilde e cordato como sempre fora, nem ao menos tirava da cabeça o seu chapéu de couro ao falar com o senhor, (o chapéu de couro era objeto de grande importância para os cangaceiros. Para eles, era no chapéu que estava a sua força), agora toma de uma arma e torna-se cangaceiro, formando um grupo, um bando junto a companheiros de infortúnio.
As tentativas de explicação para os fatores do cangaço, foram datadas desde o início do fenômeno. Opiniões de alguns autores divergiam entre si, ao estudarem o processo em sua plena florescência. Euclides da Cunha atribuiu ao fator racial, “o meio físico dos sertões em todo o vasto território que se alonga do Vasa Barris ao Parnaíba, no ocidente”, e ao que chama de “estigmas degenerativos de três raças” Euclides da Cunha baseia-se entre outros autores em Nina Rodrigues. As teses deste baiano podem ter sido fonte de opiniões errôneas acerca do cangaceirismo e o misticismo sertanejos.
Nina Rodrigues afirmava que “a criminalidade do mestiço brasileiro está ligada às más condições antropológicas da mestiçagem no Brasil”. A mestiçagem, nesse caso constituía um fator determinante para interpretação cultural.
Foram vários os autores nordestinos que sem dar atenção às causas sociais, usam uma explicação, quem sabe, a mais fácil- a mestiçagem- que nesse momento no nordeste, era considerado fator relevante e removível. Sendo assim, o cangaço e fenômenos correlatos jamais teriam remédio.
Muitos outros autores foram influenciados sob este ponto de vista. Lourenço Filho, por exemplo, depois de uma visita feita ao Cariri na década de 1920, considerava que “certas condições biológicas levam ao banditismo” . E no caso do Juazeiro, do padre Cícero, visto por ele como uma anomalia dizia: “os remédios estão aos olhos de todos, e eles se resumem em poucas palavras: em maior liberdade política aos escravizados estados do Norte, em distribuição de justiça e educação”.
Haveria, pois condições de haver liberdade política, instrução e educação popular, se o interesse do grande proprietário de terra era manter a população na total escuridão? Obter braços servis era o lema dos coronéis em detrimento às cabeças pensantes.
Xavier de Oliveira (1932), diz textualmente: “o homem honesto e trabalhador de outrora é um bandido agora, por causa de uma questão de terra”. Acrescentava quanto às condições de trabalho: “no Cariri, em certas cidades, há o que se chama de trabalhadores. Centenas de homens, reunidos em praça pública, enxada a ombro, prontos para o trabalho. Chega o fazendeiro, escolhe os mais robustos (é como se escolhesse bois para o corte) e os leva à roça. Os outros, em número de centenas, ficam sem trabalhar e sem comer, eles, suas mulheres e seus filhos” .
Estes homens forçosamente tinham de se rebelar. Estando sem terra, sem ocupação certa, explorados brutalmente, iriam se revoltar qualquer que fosse a dosagem do seu sangue, ou sua origem, o meio físico que influenciasse sobre o seu organismo. Ao mesmo tempo Oliveira concluía pedindo ajuda do exército para exterminar o cangaço. Essa foi a luta durante toda sua vida. Devia instalar desde Pajeú de Flores até Riacho do Navio, dos sertões de Pernambuco ao Cariri, onde nasceu, regiões militares e tudo estaria resolvido. Para outro nordestino, Gustavo Barroso, o cangaço seria extinto nos sertões com estes remédios: comunicações, transportes, instrução e justiça.
Nota-se que predominam causas profundas em se tratando de algumas das inúmeras opiniões a respeito do cangaço como dos surtos do “fanatismo”. Dentre outras causas, podemos observar: ausência de justiça, analfabetismo, precariedade de comunicações e transportes, baixos salários.
Dessa forma, entendemos que não é só no monopólio da terra que reside a matriz do cangaço; era em todo atraso econômico, no isolamento do meio rural, no imobilismo social, na ausência de iniciativas outras que não fossem as do latifundiário.
E em meio a esse caos, bandos armados independentes formavam-se no sertão. Eram os cangaceiros: geralmente ex-jagunços que viam no banditismo um meio de vida. Sempre saltando de vila em vila, andavam armados em bando pelo sertão nordestino nas primeiras décadas do século XX. Tinham suas próprias leis e regras de conduta. Eram temidos pelas pessoas e espalhavam medo por onde passavam. Enfrentavam com freqüência as forças policias do governo, usavam roupas e chapéus de couro, uma vez que andavam muito pela caatinga e este tipo de vegetação era provido de muitos espinhos e as roupas proporcionavam-lhes uma certa proteção.
O cangaço, banditismo típico do sertão nordestino, mais exatamente o cangaço da época de Virgulino Ferreira da Silva – Lampião foi definido nesse período como se referindo ao bandido que vive debaixo da canga, o complexo de armas sobrepondo-lhe ao corpo, bem como referir-se a uma maneira de vida e ação independente na qual o cangaceiro estaria subordinado apenas ao seu bando. Não que o cangaço fosse uma resposta à dominação dos coronéis. Muito ao contrário, conforme demonstrou Graciliano Ramos, alianças vantajosas foram firmadas entre Lampião e os mais poderosos coronéis da época. Vejamos:

[...] a relação cangaceiro-coronel mostrava-se vantajosa para as duas partes: ganhavam os bandoleiros, que obtinham quartéis e asilos na caatinga e ganhavam os proprietários, que se fortaleciam e engrossavam o prestígio com esse negócio temeroso .


Representante emblemático deste ciclo, Virgulino Ferreira da Silva, por volta de 1920, tornou-se o chefe do cangaço, reinando até 1938 quando morreu junto à sua companheira Maria Gomes de Oliveira, a Maria Bonita, morre em Angico, sertão de Sergipe. Já em 1940, com a morte de seu suposto vingador, Cristino Gomes da Silva Cleto, o cangaceiro Corisco, finda o ciclo geral do cangaço.
No que se refere à memória coletiva, Lampião se sobressaiu como uma espécie de protótipo dos cangaceiros, sobrepondo-se aos outros do seu tempo. Entretanto, deve-se atentar para o fato de que o cangaço não se resume a Lampião, como comumente se confunde. A explicação para isso é que Lampião era dotado do espírito de liderança e esta era reconhecida no bando, por se mostrar valente e habilidoso nos combates e o seu exemplo estar sempre acima da palavra.
Do ponto de vista das relações de cangaço com a sociedade de seu tempo, é bom que se leve em conta a sabedoria do chefe do bando quando construiu, logo que possível, relação com jornalistas e fotógrafos da época, dando-lhe algumas imagens favoráveis. Diferentemente de cangaceiros famosos, tais como: Jesuíno Brilhante (1844-1879), Antônio Silvino (1875-1944), Lampião teria se empenhado na construção da sua própria imagem pública. Mesmo sofrendo intensas perseguições de inimigos pessoais e das forças policiais, ao contrário daqueles dois chefes de cangaço que não se deixavam fotografar, ele resolveu dar visibilidade a si e ao seu bando através de imagens fotográficas e entrevistas.
Conforme Marc Ferro, a fotografia é um inventário temático onde se encontra.
“[...] enumeração de motivos–objetos representados, papéis sociais postos em cena, produção e recepção culturais” . Com efeito, já sabemos que os fotógrafos realmente interferem e que o seu olhar não é “inocente”. De Paula, em seu livro surpreendente sobre a Guerra de Imagens na Revolução Constitucionalista em São Paulo mostra como em torno de uma fotografia existem marcadores visuais, e que além da subjetividade do fotógrafo “[...] é preciso considerar a visão do próprio fotografado, que pode está exprimindo de forma consciente ou não, seus anseios e sua auto-imagem idealizada” .
E assim, Virgulino Ferreira da Silva, usando de sua sagacidade e defendendo a liberdade do seu bando, tornou-se o mais famoso rebelde da região. Justiceiro para alguns e bandido para outros.

FANÁTICOS

No nível cultural de desenvolvimento em que se encontravam as populações rurais, mergulhadas no quase completo analfabetismo e no obscurantismo, a sua ideologia só podia ter um caráter religioso, místico, que se convencionou chamar de fanatismo. Sob esta denominação, englobaram-se os combatentes de Canudos ou do Contestado, do Padre Cícero ou do Beato Lourenço.
Fanáticos foram denominados, adeptos de uma seita ou misto de seitas, que não fosse religião dominante. Só que a seita por eles abraçada, fortemente influencida pela religião católica, que lhe dá o substrato, era sua ideologia. Como toda ideologia, um conjunto de conceitos morais, religiosos, artísticos, que traduziam suas condições materiais de vida, seus interesses, seus anseios de libertação e seus próprios métodos de luta, justificativam-nos também.
Uma das características diferenciais do “fanático” e do cangaceiro é que o cangaço é desde o início apontado como sendo um elemento ativo, e o misticismo surge como um elemento passivo, manifestando sem nenhum fim agressivo. Entretanto, quando o grupo místico se formava em torno de um beato, monge ou conselheiro, sua tendência era adotar métodos de ação que paulatinamente iam entrando em conflito com a comunidade sertaneja.
Desde seu aparecimento ostensivo, esse grupo passa a ser hostilizado pela religião dominante. O que só faz aumentar cada vez mais o número de adeptos e a nossa corrente.
Com a propagação dessa onda de fanatismo, de norte a sul do país, revela uma separação entre a ideologia das classes dominantes e camadas médias urbanas e a ideologia dos setores das classes empobrecidas da população rural. Mas o “fanatismo” era o elemento da solidariedade grupal à reação contra a ordem dominante.
O fanatismo, elemento de luta dos trabalhadores, vem aprimorando a modalidade de reação dos pobres do campo. O surgimento e a forma como o cangaceirismo foi enfrentado, acreditamos ser o cangaço a primeira cópia e talvez a ruína e a decadência do latifúndio.
Desde que ganha influência sobre massas consideráveis da população, o “fanatismo” desempenha um papel ativo, impulsionador e emancipador local.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Pode-se imaginar a queda do conceito daquela sociedade em que o poder do grande proprietário de terra era incontrastável, até mesmo uma forma de rebelião primária, como era o cangaceirismo, representava um passo à frente para a emancipação de grande parte da população, especialmente a dos trabalhadores do campo. Isso mostrava um grande exemplo de insubmissão. Um estímulo às lutas.
O cangaço precedeu aos grandes ajuntamentos de “fanáticos” que reunidos em torno de um líder religioso, tiveram seus pontos principais em Canudos e Contestado.



REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CUNHA, Euclides. Os Sertões, 13ª ed.p.141
DE PAULA, Jesiel. 1932: Imagens Construindo a História. Campinas/Piracicaba. Editora da UNICAMP/ Editora da UNIMEP, 1998, p.33-37.
FACÓ, Raul. Cangaceiros e Fanáticos. Civilização Brasileira: Rio de Janeiro 1976.p.15

¬¬¬¬¬___________-Cangaceiros e Fanáticos. Civilização Brasileira: Rio de Janeiro 1976.p.1-____________Cangaceiros e Fanáticos. Civilização Brasileira: Rio de Janeiro 1976.p.37
FERRO, Marc. Imagem.In: LE GOFF, Jacques; CHARTIER, Roger; REVEL, Jaques. (Dir.). A Nova História. Tradução de Maria Helena Arinto e Rosa Esteves. Coimbra: Almedina 1978, p.291
FILHO, Lourenço. O Juazeiro do Padre Cícero. 2ª ed. São Paulo, s.d.
RAMOS, Graciliano. Viventes das Alagoas, Quadros e Costumes do Nordeste. São Paulo, Martins Editora, 1962, p.126.
PERROT, M. Os excluídos da História. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1988
OLIVERA, Xavier de, O Exército e o Sertão. Rio, 1932. – Beatos e Cangaceiros. Rio, 1920

quarta-feira, 30 de junho de 2010

Em nenhum momento, o Führer e seus seguidores deixaram por escrito a decisão de eliminar os judeus

As raízes do mal
A primeira vez que Hitler falou publicamente sobre uma conexão entre a guerra e o genocídio dos judeus foi em 30 de janeiro de 1939.Na ocasião, discursando para outros políticos,ele anunciou que, caso acontecesse um conflito mundial " a consequência (...) seria a anuquilação da raça judaica na Europa". Em outras palavras, o Führer queria dizer que, se a força ocidental resistissekm à expansão alemã, ele transformaria os judeus do leste europeu em seus reféns.
Depois da invasão da Poplônia pelas tropas alemãs, em setembro de 1939, a ameaça de Hitler começou a ganhar contornos assustadoramente reais.A primeira providência dos nazistas foi criar " reservas para abrigar os judeus", primeiro no leste polonês e, logo depois, na ilha africana de Madagascar.Em 1941, Hitler e seus seguidores mais próximos passaram a trabalhar a possibilidade de, em breve, poder deportar os judeus para os territórios soviéticos conquistados.
Por trás de todos esses planos, pairava no ar a idéia da " aniquilação"- uma real predisposição para matar os seres humanos deportados.Imediatamente após a Alemanha invadir os primeiros territórios soviéticos, em junho de 1941, algumas unidades militares alemãs, chamadas de Einsatzgruppen, em conjunto com outras unidades da polícia e da SS, começaram a assasssinar um grande número de judeus nas áreas recém - ocupadas.
As ações foram se intensificando gradualmente: primeiro, foram mortos os chefes de famílias; em seguida, os rapazes em idade adequada para o serviço militar; logo depois os idosos, mulheres e crianças.No final de 1941, as Einsatzgruppen já tinham matado perto de meio milhão de judeus.Hitler era mantido a par de tudo: por meio de relatórios detalhados que recebia regularmente, ele podia contabilizar cada um desses assassinatos.
Uma reconstrução precisa mostra que algumas unidades realizavam assassinatos indiscriminados já em julho ou agosto de 1941, ao passo que outras só começariam mais para o fim do ano..Isso mostra que os comandantes das unidades tinham certa autonomia: eles não estavam simplesmente colocando em ação um plano para assassinar judeus soviéticos, mas sim , seguindo sugestões extremamente abertas.
Até o meio do ano, o destino dos judeus ainda não tinha sido decidido.No dia 31 de julho,Hermann Goering, que desde 1938 assumira a responsabilidade formal de coordenar as " políticas judaicas", autorizou Reinard Heydrich, chefe da polícia de segurança nazista, a executar " todas asa providências necessárias (...) para a solução completa da questão relativa ao judaísmo na área de influência alemã na Europa".
Mas, vale lembrar, alguns documentos indicam claramente que, a essa altura, o que os nazistas compreendiam por " solução completa" ainda era apenas a deportação planejada dos judeus do Reich para o território soviético.E, para que essa estratégia fosse implementada, era preciso, antes de tudo, derrotar a União Soviética.
Em meados de setembro, Hitler deu a ordem de que se iniciassem as deportações para fora da área do Reich, no princípio somente para o gueto de Lodz, na Polônia.Pouco mais tarde, Riga, na Letônia, e Minsk, na Bielorússia, tornaram-se destinos adicionais para essas deportações.
REFERÊNCIA: Revista BBC História, Nazismo, o Terror sem Disfarces. Ano 1,Ed. n1 p.p. (18-19)

sábado, 12 de junho de 2010

ONDE LAMPIÃO SE APAIXONOU

Era primavera de 1929 quando o ousado coronel do sertão, Virgulino Ferreira da Silva, chegou num casebre de taipa, com três cômodos, de onde se veem os belos Picos do Tará.
Acompanhado do fazendeiro e parceiro Odilon Café, ele se apresentava para um dedo de prosa com Zé de Felipe no distante povoado de Malhada de Caiçara, em Paulo Afonso.O intuito era reforçar seu rol de maigos no trajeto dos cangaceiros entre Bahia, Alagoas e Sergipe.
Virgulino já era lampião e conquistava na lábia ou na faca, os moradores dos locais por onde passava.Tudo contra a delação.Era o reinado no cangaço, bando exclusivo para homens. Até então..
Naquela tarde e naquela casa de taipa, o destino do cangaço haveria de mudar.Odilon Café apresentou Lampião à sua sobrinha Maria Gomes de Oliveira, segunda filha de Dona Déa e Zé de Flipe.
A filha do casal era conheciida como Maria de Déa.Tinha então 18 anos, era casada, mas havia brigado com o marido.Sua beleza amoleceu o temido Lampião e o fez levá-la à tiracolo para amenizar as durezas da batalha na caatinga.O coração fez o chefe romper asa regras,e,a partir dali, as mulheres começaram a integrar o bando sob a batuta de Maria Bonita.
A partir daquele ano, eles seguiram errantes pelo Nordeste por uma década, até suas cabeças serem expostas nas escadarias da Prefeitura de Piranhas, Alagoas, em 28 de julho de 1938.
Parte dessa história seria muito menos palpável se a casa onde Lampião e sua amada se conheceram- e onde a Rainha do Cangaço nascera- não tivesse sido totalmente recuperada.Deve o feito ao esforço do escritor João de Souza Lima.
Morador de Paulo Afonso e fanático pelo tema, João encontrou o casebre totalmente destruído.Restavam as estacas erguidas.Conseguiu apoio do poder público local e fez a reconstituição com ajuda das pessoas que conheciam o imóvel.
Para visitá-la ,basta viajar 40 quilômetros desde Paulo Afonso, em estrada de terra, e pagar R$2 pela entrada.
Texto:Vitor Rocha vrocha@grupoatarde.com.br